O Supremo Tribunal Federal (STF) julga, a partir das 14h desta quinta-feira (9), um recurso contra o direito de abater animais em cultos de religiões de matriz africana. Para tentar impedir que a ação seja aceita pela Justiça, religiosos, povos de terreiros e simpatizantes fizeram um protesto na noite de quarta-feira (8), em frente à Câmara Municipal de Salvador.
“A intenção dessa sensibilização é explicar que não sacrificamos o animal, nós nos alimentamos com ele, realizamos um abate religioso. Toda a carne é utilizada para alimentar a comunidade e todas as pessoas que ali frequentam nos dias de função. Entenda que ali não há nenhum desperdício e sim a utilização do alimento, alimentar as pessoas”, explica Iraildes Andrade, ekede de orixá oxóssi na Casa de Oxumaré, tradicional terreiro de candomblé da capital baiana.
A religiosa compara o abate de animais com o costume de qualquer pessoa que faz uma festa em sua casa e oferece comida aos convidados. “Numa festa você oferece empada de frango, empanada de carne, no terreiro oferecemos também alimento aos nossos convidados e aos Orixás, Nkissis e voduns. Uma comida que é sacralizada, rezada”, justifica.
Foto: Marcia Lima/ Arquivo Pessoal |
Ela afirma que a tentativa de proibição do ritual religioso é um retrocesso e desrespeita a liberdade religiosa. “O que vivemos aqui é um racismo religioso, um desrespeito religioso e uma falta de conhecimento daquilo que realizamos em nossas casas”, argumenta.
Também presente no protesto, a egbombi do terreiro Ile Ase Kale Bokun e iyalorisa do Ile Ase Ewa Olodumare, Márcia Lima, defende que a prática de abate, que prefere chamar de “sacralização” de animais no candomblé, acontece em lugares limpos, com orações e cânticos e muito respeito ao animal. “Ao invés de nos perseguirem deveriam fiscalizar as condições para abate nos diversos matadouros e abatedouros do país, bem como os lares que mantém animais em cativeiro com maus tratos”, diz.
Entenda – O recurso extraordinário 494601 foi interposto pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) e discute a constitucionalidade do sacrifício ritual de animais em cultos de religiões de matriz africana. O acórdão recorrido entendeu que “não é inconstitucional a Lei 12.131/2004, que introduziu parágrafo ao artigo 2° da Lei 11.915/2003, explicitando que não infringe ao Código Estadual de Proteção aos Animais o sacrifício ritual em cultos e liturgias das religiões de matriz africana, desde que sem excessos ou crueldade. Na verdade, não há norma que proíba a morte de animais, e, de toda sorte, no caso a liberdade de culto permitirá a prática”.
O MP-RS sustenta, em síntese, que o privilégio concedido aos cultos das religiões de matriz africana para o sacrifício ritual de animais ofende o princípio isonômico e contrapõe-se ao caráter laico do Estado brasileiro. A promotoria acredita que o RS teria criado “novel causa” de exclusão de ilicitude penal, invadindo a esfera de competência legislativa da União.
O ministro relator do caso é Marco Aurélio. A Procuradoria Geral da República (PGR) se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do recurso ou pelo provimento parcial deste para eliminar da norma a expressão “de matriz africana”, permanecendo o dispositivo com a seguinte redação: “Não se enquadra nesta vedação o livre exercício dos cultos e liturgias das religiões”.
(Bhaiaba)
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