MP abre investigação contra Jovem Pan por incitar terrorismo - David Gouveia Notícias

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09/01/2023

MP abre investigação contra Jovem Pan por incitar terrorismo

Notícias e comentários da emissora que abalam a confiança nas instituições e estimulam violência são o alvo da investigação


O Ministério Público Federal (MPF) instaurou um inquérito civil contra a Jovem Pan nesta segunda-feira, 9. Os procuradores irão apurar a conduta da emissora no sentido de disseminar “conteúdos desinformativos a respeito do funcionamento das instituições brasileiras e com potencial para incitar atos antidemocráticos”.

O empresário Antônio Augusto Amaral de Carvalho Filho, o Tutinha, renunciou ao cargo de presidente do grupo Jovem Pan nesta segunda, um dia depois de a JP News ser acusada nas redes sociais de fomentar o terrorismo bolsonarista, que atacou os prédios dos três poderes, no domingo. A emissora, inclusive, foi denunciada  ao Ministério da Justiça e ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela cobertura bolsonarista dos atos de terrorismo.

Assumidamente bolsonarista, a Jovem Pan nos últimos anos vem mantendo jornalistas e comentaristas que defendem posicionamentos golpistas, que insuflam os seguidores de Jair Bolsonaro.

Leia a íntegra da nota do MPF.

O Ministério Público Federal (MPF) instaurou um inquérito civil para apurar a conduta da rede Jovem Pan na disseminação de conteúdos desinformativos a respeito do funcionamento das instituições brasileiras e com potencial para incitar atos antidemocráticos. O foco da investigação será a veiculação de notícias falsas e comentários abusivos pela emissora, sobretudo contra os Poderes constituídos e a organização dos processos democráticos do país.

O órgão realizou levantamento ao longo dos últimos meses e detectou que a Jovem Pan, a princípio, tem veiculado sistematicamente fake news e discursos que atentam contra a ordem institucional, em um período que coincide com a escalada de movimentos golpistas e violentos em todo o país.

Na cobertura dos atos de vandalismo ocorridos em Brasília neste domingo, por exemplo, comentaristas da Jovem Pan minimizaram o teor de ruptura institucional dos atos e tentaram justificar as motivações dos criminosos que invadiram e depredaram as sedes dos três Poderes. O comentarista Alexandre Garcia, contratado da emissora, chegou a fazer uma leitura distorcida da Constituição para atribuir legitimidade às ações de destruição diante do que ele acredita ser um contexto de inação das instituições. “É o poder do povo”, disse, em alusão ao artigo 1º da Lei Maior. “Nos últimos dois meses as pessoas ficaram paradas esperando por uma tutela das Forças Armadas. A tutela não veio. Então resolveram tomar a iniciativa.”

Paulo Figueiredo foi outro a proferir ataques aos Poderes da República e validar os atos de vandalismo. Mesmo quando vândalos já haviam invadido e destruído prédios públicos, o comentarista tentou imputar aos agentes públicos que neles atuam a culpa pelo caos instalado. Ele argumentou que “as pessoas estão revoltadas com a forma como o processo eleitoral foi conduzido, elas estão revoltadas com a truculência com que certas instituições têm violado a nossa Constituição”, ecoando notícias falsas sobre supostas fraudes eleitorais e atuações enviesadas ou omissivas de tribunais superiores e do Congresso Nacional. Já Fernando Capez classificou os atos como “manifestação claramente pacífica”. “Um ou outro vândalo que se infiltra, mas 99,9% são pessoas que estão ali expondo a sua indignação, sua maneira de pensar”, declarou.

Considerações de descrédito às instituições e ao processo democrático vêm ganhando fôlego na programação da Jovem Pan desde meados de 2022, antes mesmo do início do período eleitoral. Ataques infundados ao funcionamento das urnas eletrônicas e à atuação de membros do Judiciário foram cada vez mais constantes, acompanhados depois de suspeições sobre o próprio desfecho da eleição. O comentarista Rodrigo Constantino, em 14 de novembro, atribuiu o resultado dos processos democráticos do país a “um malabarismo do Supremo”. Já sua colega Zoe Martinez defendeu, em 21 de dezembro, que as Forças Armadas destituíssem os ministros do STF.

Vários dos programas analisados também continham falas com potencial efeito de incitação a atos violentos no país. Exemplo foi registrado em 22 de dezembro, quando Paulo Figueiredo resumiu o cenário político-social a duas alternativas: a aceitação de “uma eleição sem transparência, sem legitimidade, sem confiança da população” e a deflagração de uma guerra civil. Diante delas, sentenciou: “Então que tenha uma guerra civil, pô!”. Dias depois, o mesmo comentarista diria que uma intervenção militar não traria consequências gravosas ao país e que, em caso de reação de grupos como o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto, caberia “mandar esses daqui para um lugar pior”. “Passa cerol, pô, vocês são treinados para isso!”, concluiu, dirigindo-se a integrantes das Forças Armadas.

Ordens - O MPF enviou ofício determinando que a Jovem Pan forneça, em até 15 dias, informações detalhadas sobre sua programação e os dados pessoais dos apresentadores e comentaristas dos programas Jovem Pan News, Morning Show, Os Pingos nos Is, Alexandre Garcia e Jovem Pan – 3 em 1. O documento inclui ainda uma notificação para que a empresa se abstenha de promover quaisquer alterações nos canais que mantém no YouTube, seja a exclusão de vídeos, seja tornar sua visualização restrita, pois todo o conteúdo será objeto de investigação minuciosa.

Ao YouTube, o MPF ordenou a preservação da íntegra de todos os vídeos publicados pela Jovem Pan desde janeiro de 2022 até hoje. A plataforma deverá ainda informar em até 30 dias a relação completa dos conteúdos removidos ou cujo acesso público foi restringido pela emissora, para compreender melhor quais razões motivaram essas ações. O YouTube terá também que indicar os vídeos que foram alvo de moderação de conteúdo pela própria plataforma ao longo do ano passado, especificando os fundamentos adotados nesse controle.

Abusos - O MPF lembra que a livre expressão do pensamento não exime a Jovem Pan de respeitar outras diretrizes constitucionais e legais referentes às atividades de comunicação, sobretudo porque parte de seu conteúdo é veiculado via rádio, uma concessão pública sujeita a limites relevantes. O artigo 5º da Constituição garante o acesso de todos à informação, não como o simples direito de recebê-la, mas de obter conteúdos qualificados. Ainda na Carta de 1988, o artigo 221 determina que emissoras de rádio e TV deem preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas em sua programação, com respeito a valores éticos e sociais da pessoa e da família.

“Tendem a violar tais finalidades educativas e informativas, e em especial valores éticos da pessoa humana, conteúdos que sistematicamente veiculam desinformação sobre o funcionamento das instituições democráticas do país e, sobretudo, que incitam violência e ruptura em face dos Poderes estabelecidos”, destacou o MPF na portaria de instauração do inquérito.

O MPF ainda aponta que o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/1962), ao qual a Jovem Pan está submetida enquanto concessionária do serviço de radiodifusão, é claro ao estabelecer que a liberdade de transmissão por som e imagem não exclui a punição dos que praticarem abusos no seu exercício. Segundo a norma, incorrem em tais violações aqueles que empregarem os meios de comunicação para a prática de crimes previstos na legislação em vigor. Entre os exemplos estão incitar a desobediência às leis e a ordens judiciais, fazer propaganda de guerra ou de processos de subversão da ordem política e social e caluniar, injuriar ou difamar os Poderes Legislativo, Executivo ou Judiciário ou seus membros.

A investigação avaliará se a Jovem Pan violou direitos fundamentais da população e incorreu em abusos à liberdade de radiodifusão. Providências poderão ser adotadas tanto para impor multas e indenizações por dano moral coletivo quanto para acionar a Justiça em favor da suspensão da concessão por até 30 dias e até mesmo sua cassação. Para o MPF, “o regime de direito público pertinente aos serviços de radiodifusão coloca limites à iniciativa privada, ao exigirem que sua exploração voltada ao lucro seja compatibilizada com responsabilidade social”.

Fonte: brasil24

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